João Carlos Martins nasceu em 25 de junho de 1940, com cinco quilos e seiscentos gramas tinha tudo para ser grande, forte e saudável mas o destino não demorou a colocar o primeiro obstáculo no caminho desse paulistano. Aos cinco anos de idade, fez uma cirurgia para retirada de um cisto no pescoço. A operação foi mal sucedida e as sequelas persistiram por longos dois anos. Superado o primeiro problema, de uma vida que seria atribulada, João começou a ter aulas de piano. Em apenas duas semanas, o menino já dominava a clave de sol e de fá. Foi o começo de uma carreira de sucesso que o levou aos melhores teatros do mundo, aos 20 anos já havia tocado no Carnegie Hall, sendo considerado o melhor interprete das obras de Bach, e mesmo jovem já era um dos mais conceituados pianistas do mundo.
Sua biografia mistura lances espetaculares e trágicos que tiveram inicio no auge de sua carreira como pianista aos 26 anos.
Era verão de 1965 em Nova York e aceitou o convite para treinar com o time da Portuguesa, que estava em turnê nos Estados Unidos com apenas 18 jogadores, durante o treino Martins caiu sobre uma pedra, que perfurou um nervo do braço. O músico foi submetido, então, a uma cirurgia na mão direita. Ficou um ano em recuperação, mas teve um retorno triunfal arrebatando Washington, capital dos Estados Unidos, com sua interpretação de J. S. Bach, sua especialidade.
No entanto, não demorou muito e Martins foi acometido por uma nova fatalidade. Durante o festival de Berlim de 1966, o músico foi operado do apêndice. Em seguida, para completar o azar, é diagnosticado com uma embolia pulmonar. Foram 15 dias entre a vida e a morte, e dois meses no hospital. Mas ele ainda voltou. Voltou para parar em 1970, quando as dores na mão direita não davam trégua e acabaram interrompendo a carreira do pianista mais famoso do Brasil.
Foram sete anos de tratamento para uma volta triunfal num Carnegie Hall lotado. A obra escolhida para rechear seu retorno foi o primeiro volume de “Cravo Bem Temperado”, de Bach, claro!
Tornou-se secretário de Cultura do Estado de São Paulo, lançou um disco com músicas de Chopin e tocou enquanto seus reflexos o permitiam. Em 1985 descobre sofrer de LER (lesão por esforço repetitivo) e interrompe, novamente, sua carreira por oito anos.
Um dos piores erros do pianista foi entrar para vida política paulistana, ainda mais ao lado de Paulo Maluf. Em 1993 estoura o escândalo Pau Brasil, que é uma empresa comandada por Martins e estaria envolvida em doações ilegais às campanhas de Maluf. Porém, logo depois, é absolvido das acusações pelo Supremo Tribunal Federal.
Mas o alívio da absolvição durou pouco, no mesmo ano de 1995 João Carlos Martins reagiu a um assaltou em Sófia, capital da Bulgária, e foi agredido com uma barra de ferro, que o atingiu gravemente na cabeça. Como efeito, o músico teve o lado direito de seu corpo paralisado parcialmente
Sem agilidade, em 1998 encerrou sua carreira em Londres, antes de passar por mais uma cirurgia na mão direita. Mas João Carlos Martins é forte e em 2000 conseguiu voltar ao piano, tocando apenas com a mão esquerda. Mas a força do pianista ainda iria ser testada mais uma vez. Dois anos depois, ele descobre, em Paris, que sofre de uma doença chamada Contratura de Dupuytren, a mesma que acometeu Leonardo da Vinci. As duas mãos ficaram comprometidas.
Mas como toda história deve ter um final feliz, ainda que esta esteja longe de ser um conto de fadas, vamos ao ano de 2003, quando Martins decide estudar regência. Nesse ano ele fez outra cirurgia e ouviu dos médicos que nunca mais tocaria piano. Aos 63 anos, então, começou a estudar regência com o maestro Júlio Medaglia. Seis meses depois já estava gravando Bach com seus músicos.
Em 2004, João Carlos Martins estréia oficialmente a Orquestra Filarmônica Bachiana, na Sala São Paulo, com 41 músicos. Porém, um dos maiores artistas que o Brasil já viu, apesar de todo sofrimento, não foi esquecido. Em 6 de janeiro de 2007, com sua orquestra, é ovacionado em Nova Iorque, num Carnegie Hall com três mil pessoas, que o aplaudiam de pé por oito minutos. Como não consegue segurar a baqueta e nem virar as partituras, o maestro foi obrigado a decorar dez mil páginas de partituras. Ao final da apresentação, tocou Bach apenas com o polegar.
Superação, determinação, amor, perseverança...